quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Discos raros ( e caros) - parte 5





Nesse post vou apresentar-lhes um dos itens mais raros e curiosos da história do vinil: os flexi discs. Como a maioria sabe, os discos fonográficos começaram a ser moldados com um material duro e quebradiço (a goma-laca). Isso foi até idos de 1948, quando então surgiram os discos de vinil propriamente ditos: altamente resistentes, leves, e flexíveis (até certo ponto). Mas o verdadeiro conceito de flexibilidade entre os discos surgiria depois na Rússia: os flexi discs, discos tão flexíveis que podiam ser enrolados como um tubo de cartolina!

Na realidade tudo começou com a necessidade. Sempre ela, a mãe da invenção. Acontece que na Rússia comunista do pós-guerra, não era permitido a importação de discos, e tão pouco era autorizado que gravadoras locais lançassem álbuns de artistas estrangeiros. Naqueles tempos sim era difícil ouvir um Rock n Roll. Mas os russos, povo muito criativo, deu um jeito.

Tudo começava com um disco de vinil original, contrabandeado da Europa Ocidental. Esse disco chegava às mãos dos russos como uma "matriz". A partir dele era "pirateado" os flexi discs que eram gravados de forma artesanal. As faixas do disco original eram transpostas para o novo disco, que não era de vinil, visto que esse material era difícil de se obter no país comunista. Como matéria-prima dos flexi discs eram utilizadas velhas chapas de raio-X ! Os flexi discs na Rússia eram conhecidos como "bones", "ribs" ou "roentgenizdat". Bones (ossos) , Ribs (costelas) eram associações óbvias, devido às chapas de raio-X. Já roentgenizdat vinha da fusão das palavras russas roentgen ray (raio-X) e izdat (editora).

Os punks adoravam o estilo flexi disc de ouvir música. A manufatura caseira dos discos condizia com a ideologia punk do "faça você mesmo". Os headbangers que vieram depois a utilizar também a técnica dos flexi discs, igualmente aclamavam o jeitinho russo de fazer metal: quer esquema mais true do que um disco estampado com uma fratura exposta, ou um crânio rachado?

Com o passar dos anos os flexi discs deram uma aprimorada, e os fleximakers passaram a obter vários materiais para confeccionar seus flexis: passou-se a utilizar todo tipo de plásticos, sendo que o resultado foram discos dos mais variados formatos, cores, e até com diferentes flexibilidades. Alguns chegavam a ser totalmente dobráveis!



Fato é que essa flexibilidade era de certa forma fundamental. Se a polícia te pegasse com um disco pirata desses, era cascudo e xilindró na certa. Dobrar a parada e esconder facilmente as evidências do "crime" era a possibilidade que se tinha para escapar dessa furada.

Mas nem tudo era festa nos flexi discs. Eles tinham sérios problemas. Não precisa nem dizer que a qualidade sonora era de ruim para péssima. Imagina se um disco gravado na quiçuba do cú da Rússia, escondido da polícia, usando uns plásticos de bunda achados no lixo ia ter a mesma qualidade de um LP saído da fabrica da EMI.

Outro problema é que o processo caseiro de gravação facilmente se danificava: riscos e imperfeições na superfície dos flexis eram coisa normalíssima. E os disquinhos eram tão finos, e tão leves, que as vezes eles não funcionavcam no toca-disco. Isso acontecia porque a bandeja do aparelho rodava, mas o disco ficava "flutuando" sobre ela. Para esse empecilho, alguns fleximakers chegaram a desenvolver espaços no próprio flexi disc onde era possível encaixar uma moeda, para dar o peso necessário ao disco, para o mesmo ser reproduzido!

Talvez o problema mais sério desses curiosos discos era o fato deles serem gravados em tamanho de 7 polegadas (como se fosse formato Ep) e apenas de um lado. Os discos de vinil convencionais tinham 12 polegadas e música dos dois lados. Assim sendo, para copiar um álbum com 60 minutos de duração por exemplo, era necessário gravar uns 6 flexi discs! Um LP duplo original resultava em uns 10 flexi discs no mínimo! Tem noção da dificuldade? E você que achava que virar o vinil do lado A para o lado B era um saco! Há relatos de músicas mais longas que tiveram que ser fracionadas em 2 discos! Carai!

Graças a Dio a Rússia hoje não é mais assim, e os irmãos roqueiros e headbangers de lá podem apreciar uma música com a qualidade que merecem. Aliás um abraço pro povo de lá, temos 45 visitantes que acompanham o blog direto dos confins russos! Cпасибо!

Hoje os flexi discs sobrevivem como itens de coleção muito cobiçados. Um flexi disc russo original pode ter seu valor variando entre 50 a 450 dólares. Eu disse UM flexi disc. Se for um conjunto deles que fecha um álbum completo, dependendo do artista, da conservação e integridade musical do mesmo, pode valer até mil ou dois mil dólares (vai depender também de quantos flexi discs integram o pacote). Um exemplo mais específico pode ser um Somewhere In Time do Maiden. O preço do LP normal, edição russa (de quando foi liberado a fabricação) é de U$24,00. A versão da época do lançamento, em Flexi Disc custa U$75,00

Claro que depois dos russos a moda se espalhou, chegando até os EUA e Japão, onde a técnica foi apurada, e os flexi discs eram utilizados não somente para música, mas também como manual de instruções, curso de idiomas, audio books entre outras coisas. Quase sempre eram vendidos acompanhando um livro ou revista.

Mais recentemente, nos anos 90 e 2000, algumas publicações especializadas lançaram uns flexi discs comemorativos para quem quissesse conhecer essa peça da história do vinil. Foi assim que tive a felicidade de obter um desses, com uma faixa do Sepultura.


CDX

2 comentários:

Erasmus "Garp" disse...

Quando criança tive uma coleção das histórias da Disney de discos flexíveis azuis.

CDX, omisso mas ainda vivo! disse...

Massa Garp! Se vc tiver ainda deve valer uma graninha hehehe